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Um reticente voto de confiança

Moody’s melhora perspectiva da nota de crédito do País, mas destaca dependência de receitas e baixa capacidade do governo para cortar gastos como risco à retomada do grau de investimento

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Por Notas & Informações
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A agência de classificação de risco Moody’s revisou a perspectiva da nota de crédito do País de estável para positiva. A classificação dos títulos da dívida brasileira foi mantida em um patamar dois degraus abaixo do grau de investimento, mas a alteração da perspectiva, que não ocorria desde 2018, sinaliza que a nota poderá ser elevada no médio prazo.

A Moody’s disse que as perspectivas de crescimento da economia estão mais robustas que nos anos pré-pandemia. A agência destacou as reformas estruturais aprovadas em múltiplas administrações nos últimos anos e um progresso contínuo, embora gradual, rumo à consolidação fiscal e à estabilização da dívida do País.

O Ministério da Fazenda, por óbvio, comemorou e afirmou que a mudança da perspectiva do rating pela agência é um reconhecimento do papel do arcabouço fiscal. Mas o relatório da Moody’s não deixou de mencionar os riscos associados à redução dos déficits fiscais, como a dependência de receitas e a baixa capacidade do governo para cortar gastos.

Para a equipe econômica, a notícia não poderia ter sido anunciada em momento melhor. De certa forma, a decisão da Moody’s chancela o esforço de Haddad, criticado por rever as metas fiscais de 2025 e 2026 e no meio de um embate com o Congresso em torno da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia e dos municípios.

O comunicado, no entanto, é realista ao analisar os fatores que podem melhorar ou piorar a nota brasileira. O aumento da credibilidade da política fiscal, segundo a Moody’s, depende de melhorias constantes no resultado primário e de um crescimento econômico mais sólido. A manutenção ou elevação dos déficits, por outro lado, pode enfraquecer a confiança dos investidores, conter o crescimento econômico e aumentar o custo do crédito do governo.

Por coincidência de datas, o Tesouro Nacional havia acabado de divulgar que as contas do governo central encerraram o mês de março com déficit de R$ 1,5 bilhão. No trimestre, o saldo ainda é positivo em R$ 19,431 bilhões. No acumulado de 12 meses até março, no entanto, o déficit atingiu R$ 247,7 bilhões, o equivalente a 2,2% do Produto Interno Bruto (PIB), ainda muito distante da meta de déficit zero.

A arrecadação subiu 8,9% no trimestre em termos reais, mas as despesas aumentaram 12,3% ante os três primeiros meses do ano passado. É verdade que o comportamento dos gastos foi influenciado pela antecipação do pagamento de R$ 30 bilhões em precatórios, mas parte das receitas que mais influenciaram o resultado fiscal também teve caráter pontual. A tributação dos fundos exclusivos rendeu R$ 12 bilhões, mas o resultado se deve à taxação dos estoques e tende a ser bem menor a partir de agora. Já a arrecadação com o Imposto de Renda, ao contrário do que se esperava, começou a desacelerar.

Enquanto isso, despesas obrigatórias com aposentadorias e pensões aumentaram 5,3% no primeiro trimestre, ou R$ 10,7 bilhões; dispêndios com benefícios de prestação continuada subiram 17,2%, ou R$ 3,8 bilhões; e gastos discricionários, nos quais a margem de manobra do governo é um pouco maior, mas também limitada, aumentaram 21,7%, ou R$ 5,4 bilhões.

É por isso que o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, foi comedido ao comentar o resultado. A meta é factível, segundo ele, mas o País “não tem margem para queimar”. Já o diretor de pesquisa macroeconômica para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, afirmou que os economistas estão certos ao duvidar do arcabouço fiscal, pois o País terá “déficits primários a perder de vista”. “Quem controla o gasto é o governo e, se não tem receita, tem de ajustar o gasto.”

Pode até parecer que o mercado está bem mais pessimista do que a Moody’s, mas o motivo do ceticismo dos analistas – o gasto – é fundamentalmente o mesmo que a agência menciona como um fator de risco em seu relatório, ainda que de maneira mais polida. É urgente, portanto, que o governo se empenhe nesse objetivo, pois disso dependem a credibilidade da política fiscal e a recuperação do grau de investimento.